por Patrícia Marques

Infelizmente, por diversas vezes, os ideais igualitários são corroídos pela própria natureza humana, e acabam por virar tiranias. A Revolução dos Bichos, de George Orwell, escrito na época da Segunda Guerra Mundial, trata dessa questão.

 

O livro ataca a ditadura de Stalin, fazendo um retrato muito fiel, através de bichos, do que ocorre na tentativa de implantar o comunismo. Aqueles que acreditam e se sacrificam pelos ideais da revolução, no livro, e por diversas vezes na vida, acabam sem recompensas. O sonho de uma vida melhor conquista o homem através das emoções, mas na hora dos resultados, a irracionalidade cobra um preço alto.

 

A promessa do paraíso sem esforço, que conquistou todos os animais do livro, até hoje também enfeitiça o homem. No livro uma canção foi criada para transmitir a mensagem igualitária do sonho dos animais da granja. Todos repetiam aqueles versos com profundo entusiasmo, e até mesmo fanatismo. O futuro seria magnífico. A riqueza, incomensurável. Para tanto, bastava lutar, mesmo que custasse a própria vida. Nós cantamos algo parecido como: “Desafia o nosso peito a própria morte! Ó pátria amada, idolatrada, salve! salve!”, e tantas outras canções ufanistas. (Se souber também alguma letra de propaganda ufanista comente no blog).

 

Sansão, o forte cavalo, era o discípulo mais fiel. Não sabia pensar por conta própria, aceitando os porcos como instrutores, por sua reconhecida sabedoria. Passava adiante o que era ensinado, através da repetição, como vemos de fato nos chavões e slogans repetidos pelos comunistas da época histórica que o livro foi escrito. A figura de Sansão é o retrato perfeito do idiota útil, que bem intencionado, acaba servindo aos oportunistas.

 

 Mandamentos, regras, leis, foram criadas, mas com o tempo, tudo foi sendo devidamente ignorados pelos novos donos do poder, que os alteravam sem nenhuma cerimônia. Sempre com a desculpa que toda e qualquer ação era para o bem da granja 

     

O Stalin do livro é Napoleão, um porco muito esperto que criou cachorros amedrontadores em segredo. Quando chega a hora de assumir todo o poder, Bola-de-Neve vira vítima dos cães adestrados de Napoleão. Bola-de-Neve seria o Trotski no livro. A história é totalmente reescrita por Napoleão, que transformou Bola-de-Neve em um espião, que trabalhava para o inimigo desde o começo da revolução. As decisões passam a ser tomadas por uma comissão de porcos, liderada por Napoleão. E a idéia que Napoleão passa é a de grande sacrifício, tendo que carregar o fardo da responsabilidade, em busca sempre do bem de todos. Era isso, ou o retorno do homem malvado. Era infalível esse argumento.

 

Começa então um culto ao líder, como costuma ocorrer nos países socialistas. Napoleão passa a dormir na cama, ignorando um dos mandamentos da revolução, que passa a contar com um adendo que diz que nenhum animal deve dormir em cama com lençóis. O mandamento de que “nenhum animal mataria outro animal” foi substituído por outro no qual “nenhum animal deveria matar outro sem motivo”.  A miséria dominou  a granja, mas os porcos comiam cada vez melhor. O cavalo Sansão trabalhava cada vez mais, convencido de que Napoleão estava sempre certo. Acabou doente de tão cansado, e foi levado para um abatedouro, sem piedade.

 

Todos os ideais igualitários pensados um dia viraram só um: “todos os bichos são iguais, mas alguns bichos são mais iguais que outros”. Os porcos ligados a Napoleão passaram a negociar com os homens de outras granjas, passaram a beber álcool,  e aprenderam a andar em duas patas, coisas que eram proibídas na revolução. No fim, era completamente indistinguível quem era porco e quem era homem. Instalam um regime tão opressor ou mais que o anterior, tudo em nome da granja da igualdade.